domingo, 15 de novembro de 2009

A SPOKFREVO ORQUESTRA


Sou testemunha ocular e auricular, embora muito suspeito, por pertencer a diretoria da SpokFrevo Orquestra, de um fato que está mexendo com o conceito da música moderna hoje na Europa.

Quando em 2003 resolvemos fazer um frevo rebuscado, dirigido a uma platéia sentada e calada, diferente dos dias de Momo – onde o frevo é executado de qualquer jeito, sem grandes ensaios para um público instigado pela folia, pelo passo e pela alegria – tínhamos plena consciência do que estávamos fazendo e nos metendo. Houve e há quem nos critique até hoje, e eu não tiro a razão deles, pois nunca prestaram a devida atenção ao ritmo como arte e linguagem musical, apenas como trilha sonora do encanto carnavalesco pernambucano, o que é uma magia, linda e maravilhosa, embora não seja tudo!

Sempre nos questionamos por que o frevo não era executado durante todo o ano e eu sempre achei isso fácil de responder: Porque é uma música exclusivamente carnavalesca, sem chances para outras ocasiões, talvez para um réveillon ou um final de festa apoteótico. Depois do surgimento da SpokFrevo Orquestra, esse conceito mudou completamente, o frevo passou a ser tratado como ator principal e não mais como coadjuvante.

Mostrar o frevo com a dignidade dessa orquestra é inédito em nossa história. Tocá-lo de paletó e gravata, numa manifestação de respeito e carinho, com uma orquestra completa e arranjos modernos, dando aos músicos a liberdade de expressão, assim como no jazz, ninguém fez antes da SpokFrevo. Não mesmo! Uma tentativa aqui, outra ali, e nada mais. Um trabalho com uma consistência estética e musical desse grupo é inédita e bastante louvável.

Uma vez perguntado como a platéia reagia ao frevo na Europa, Spok respondeu: “O que eu acho mais mágico é o silêncio, ver todas aquelas pessoas sentadas e caladas ouvindo nossa música e no final aplaudir calorosamente! Nós adoramos e vamos continuar tocando no carnaval, no meio do povo, nos palcos e pólos de animação, mas para nós músicos é tão bom quanto tocar para uma platéia silenciosa, um frevo mais trabalhado, com arranjos mais elaborados e isso vem nos mostrando que estamos no caminho certo e com isso conseguimos executá-lo o ano inteiro aqui e no exterior!”

Isso é muito bom e importante! A SpokFrevo Orquestra já esteve em vários países da Europa e também na China, na Índia, na Tunísia, na África do Sul, sempre completa e apresentando um frevo de alta qualidade, aplaudidíssima a cada show que faz. Essa maneira de tocar frevo impressionou principalmente o público apreciador do jazz, da música instrumental, da World Music. Não é a toa que nosso CD e DVD se encontram nas prateleiras desses gêneros, ao lado de grandes nomes como Sony Rollins, Quincy Jones, Chik Corea, entre outros, com um selo adicional “novidade”.

Muitas pessoas perguntam por qual motivo não usamos bailarinos nem cantores. Teve quem ficasse indignado por não levarmos essas duas peças ao Maracanã na ocasião em que tocamos no encerramento do PAN em 2007. A resposta é simples:
Quando fazemos um frevo para ser apreciado como música, não devemos cometer tal erro. A poesia e o bailarino roubam a cena e o cuidado à música. Naquele momento estamos tocando frevo no mais alto sentido da palavra, nada pode rouba-lhe a atenção. Há momentos para isso, mas ali, por exemplo, não era o caso. Nós Tb usamos bailarinos e cantores quando fazemos bailes carnavalescos.

Em 2005 recebemos o Prêmio TIM como banda revelação da Música Brasileira, para nós uma alegria singular. Em 2009 recebemos o prêmio de melhor grupo e melhor CD de música instrumental do país. Nossa felicidade só aumentou, pois o prêmio foi dado a um grupo e um disco exclusivamente de frevos, de frevos instrumentais. Isso é muito representativo e vem reforçar a crença de que estamos no caminho certo, fazendo a coisa certa.

O fato é que, hoje, o Frevo se tornou uma espécie de embaixador de nossa cultura no velho continente. Atravessou o atlântico de cabeça erguida e entrou, entre outros lugares, no Palácio Elysée, onde foi solenemente recebido pelo presidente da França e seus convidados no Dia Internacional da Música, em 21 de julho de 2008. Temos nos apresentando em requintados clubes e festivais de Jazz da Europa, sendo assistidos por mais de 300 mil pessoas em mais de 40 apresentações. Recentemente, em Paris, gravamos um show para a RTL, uma das mais importantes rádios francesas, que atinge um público também estimado em 300 mil ouvintes.

É muito bom, por exemplo, chegar ao aeroporto de Marceille, no sul da França, para embarcar para Itália, e assistir a uma apresentação nossa nos telões da sala de embarque chamando a atenção de todos. É muito bom ouvir elogios de pessoas nas ruas, dizendo que nos assistiu num determinado evento, que nos viu na TV, sempre com um semblante de alegria e prazer estampados no rosto! É muito gratificante saber que uma apresentação em que fomos anunciados com um ano de antecedência na Normandia vendeu todos os ingressos antecipados. No dia, tivemos que fazer dois shows, para todos que estavam do lado de fora querendo pagar para nos ver.

Em Londres, por exemplo, um país que não é muito aberto a música de outros mundos, eu vi o público hipnotizado com o nosso frevo. Tocamos no Barbican, uma das salas mais requintadas do mundo, para uma platéia de formadores de opinião, de críticos de arte, de jornalistas e amantes do jazz. Esse pra mim foi o show mais importante da nossa recente turnê pela Europa. Nessa ocasião, ao final do show, tivemos a oportunidade de mostrar como o frevo sempre foi tocado no carnaval durante seus 100 anos, arrastando multidões. Descemos do palco e fomos até o lado de fora do famoso Centro Cultural, num grande e animado arrastão. Esta apresentação foi mostrada para todo o Brasil através do Jornal Hoje e do NE TV, feita pelos correspondentes da Rede Globo em Londres.

Em 2008 no Festival de Jazz de Montreux, fizemos duas apresentações no palco das Big Band. Orquestras de todo o mundo ali se apresentaram. Foi mostrado por elas um repertório, na maioria das vezes bastante conhecido dos amantes do gênero. Quando chegou a nossa vez, o local ficou repleto de gente, inclusive de músicos das outras bandas, entusiasmadíssimos com o que estávamos apresentando. Era algo diferente aos ouvidos deles. No dia seguinte, nosso show gerou uma grande uma grande disputa por lugares perto ao palco, vendemos todos os CD´s e DVD´s que carregávamos. Ao final, músicos e maestros queriam cópias de nossas partituras.

Tenho a impressão, assim como Frédéric Gluzman, nosso empresário na Europa, que, dentre breve, surgirão orquestras de frevo na França, Holanda e outros lugares do continente. Surgirão frevos nos repertórios das orquestras estrangeiras.
Em maio de 2009, Spok esteve em Nazaten, na Holanda, durante um intervalo de 5 dias em nossa primeira turnê do ano, para ensinar uma orquestra local a tocar frevo e isso é o começo de uma nova página na nossa história.

Quem quiser que ache um absurdo o que vou dizer agora, mas é um fato, e contra fatos não existem argumentos: A SpokFrevo Orquestra criou uma nova conduta moral para o frevo e está mostrando ao Brasil e ao mundo o quanto é bela e rica nossa música, derrubando várias e antigas teorias, quebrando tabus e colocando o Recife e Pernambuco em seu devido lugar como gerador de grandes talentos musicais.
O frevo está para o Capibaribe, assim como o jazz para o Mississipi.

3 comentários:

  1. Grande Ze, sempre botando pra lascar! um grande abraco!

    Bruno Lins

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  2. Grande Zé "Anderson",

    Depois de Cuzzy, Capiba, Zoca e Nelson Ferreira...
    Spok é "o cara", o gênio, a referência, o orgulho na música genuínamente brasileira.
    Como diz Paulo Lampião: "Tudo na vida é jazz".

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  3. quero parabeniza-lo por sua contribuição a música, pelos projetos realizados com sucesso, e pelos belissimos texto no seu blog. parabéns. Deus te abençoe

    wallace seixas

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